É preciso que aprendamos a nos proteger. Não de um mal difuso, de forças ocultas, de poderes dispersos. Precisamos nos proteger das ações humanas bem concretas; ou melhor, das consequências públicas de ações que simplesmente deconsideram seus efeitos sobre aqueles que estão à sua volta.
É o caso da mineração predatória. Uma atividade que faz de nós invisíveis sociais e que se nega a reconhecer nossa dignidade. A exploração dos recursos naturais e do trabalho humano assumiu em nosso tempo uma dimensão trágica e ameaçadora: ameaça a vida das atuais e futuras gerações. Esses recursos não podem mais ser pensados apenas associados ao funcionamento da indústria de mineração. É preciso que se leve a sério a questão política e social que envolve a atividade de exploração sem limites em que estamos sendo enredados. Para isso, é preciso que promovamos uma mudança do modelo de desenvolvimento, uma mudança profunda dos paradigmas que orientam nossas ações cotidianas, uma revisão de valores como justiça, liberdade e equilíbrio. Todos, valores que devem ser voltados para a valorização da dignidade humana.
A hegemonia de valores como a competitividade, desenvolvimento econômico e crescimento a todo custo nos levou à silenciosa tragédia que ameaça tomar conta de toda a Minas Gerais.
É preciso que as pessoas se defendam dos "decretos expropriatórios" que permitem ao governo-minerador declarar a disponibilidade de toda uma paisagem cultural e de comunidades inteiras para fins de "investimento" e "geração de empregos", inclusive dentro dos perímetros urbanos. O critério do governo-minerador, na verdade, é apenas um: deixar explorar jazidas economicamente viáveis, onde quer que elas estejam. Não contam as pessoas, não contam as cidades, não contam o patrimônio paisagístico e cultural, não conta a memória. O governo-minerador decide se nosso quintal pode ser transformado em depósito de rejeito de mineração. A nós cabe o lixo ("rejeito"), o que é economicamente inviável, os desumanos custos da exploração de matéria-prima para engordar ainda mais o insaciável dragão da mineração.
"Protocolos" com as mineradoras são assinados diretamente nos palácios de governo. Do mapa de Minas são varridas as pessoas, seus lares e sua história. Confiram os mapas do DNPM (Departamento Nacional de Pesquisa Mineral). Você não está lá, sua casa não está lá, sua cidade não está lá. Aquela trilha, aquela caverna, aquela cachoeira ou córrego onde você passou sua infância e onde hoje você descansa com sua família, pra onde você foge quando precisa reencontrar sua humanidade e seu passado, nada disso está no mapa. Nada disso existe. Somente jazidas.
O legalismo garante a exploração: "tudo está sendo feito rigorosamente nos termos da lei", afirmam mineradoras e governos. A apropriação de tudo que é bem comum - da água, da terra, das montanhas, da vida e saúde humanas - simplesmente acontece, e se "legitima" como que por encanto.
Tudo legal, mas imoral. Se desejam realizar uma pesquisa mineral no Pico do Itacolomi, o fazem. Se querem o ouro de Paracatu, o tiram. Se querem uma Casa de Pedra maior em Congonhas, que venha abaixo o Santuário de Bom Jesus de Matosinhos. E assim o Caraça, as águas do Gandarela. Serra Azul, Serra da Moeda, Serra da Piedade, todas as serras.
Em todo lugar uma mina: afinal, "minas, são muitas". Tantas que já não há mais lugar para gente. A famosa frase de Guimarães Rosa assume, hoje, ares de trágica premonição.
O poder minerador se tornou maior que as instâncias políticas responsáveis pela defesa dos direitos das pessoas. Um Estado dentro do Estado. É em nome de lucro e crescimento que falam e agem. Em nome dessa crença, desta religião, se autorizam a intervir até na geografia de Minas Gerais. Favelização, sobrecarga das estruturas urbanas, degradação ambiental, desertificação, esgotamento de nossos recursos hídricos.
A questão é também de ordem ética: a mineração age hoje desvinculada de quaisquer valores sociais e humanísticos de uma nova era de responsabilidade, de consciência quanto às consequências coletivas de nossas ações. Claro que não é o que os discursos das mineradoras dizem. Vejam a publicidade. Só os ingênuos acreditam.
É preciso agir. Boa parte daqueles que elegemos para defender nossos direitos estão nos traindo. Não nos enxergam do alto dos ombros dos gigantes nos quais estão montados (ou será o contrário?).
Por isso, informe-se! Comprometa-se! Venha defender a qualidade de vida para você, para os seus e para as futuras gerações. Diga não à mineração em área urbana. Se posicione a favor de uma definição participativa e democrática de marcos regulatórios para a mineração.
Juntos, não temos como ser ignorados.
Mariana Viva
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