quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Governo do Estado e Samarco decidem sepultar Bento de vez




A obra tida como essencial pela Samarco para evitar carreamento de rejeitos de mineração da Barragem do Fundão e outros problemas no período chuvoso teve aval de órgãos ambientais e foi autorizada pelo governo de Minas Gerais. Decreto publicado ontem no diário oficial do estado, o Minas Gerais, dá permissão para o início da construção do Dique S4, que alagará parte de Bento Rodrigues, distrito de Mariana destruído pela lama que vazou da barragem quando ela se rompeu em 5 de novembro, causando 19 mortes e poluindo rios.

Como o Estado de Minas mostrou na edição de 16 de setembro, a autorização, chamada de requisição administrativa, dependia de um laudo técnico da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad). O estudo foi entregue e subsidiou o projeto de construção do dique, alvo de longo impasse entre as mineradoras donas da Barragem do Fundão e os ministérios públicos de Minas Gerais (MPMG) e Federal (MPF).

No decreto, o governo determina “a requisição administrativa para a implantação do Dique S4, no terreno situado no município de Mariana, conforme descrição perimétrica”. Cita que a requisição do terreno “é necessária à efetivação de medidas urgentes para a construção e implantação do Dique S4”. “A Samarco Mineração S/A fica autorizada a promover todas as medidas necessárias à construção e implantação emergencial do Dique S4 no terreno descrito”, completa o documento.

O texto ressalta que as obras serão custeadas e efetuadas com recursos e pessoal próprios da empresa. Além disso, informa que os “proprietários das áreas deverão viabilizar a entrada da equipe técnica da Samarco Mineração S/A e dos agentes públicos estaduais no terreno”.

O decreto também determina que as empresas Samarco, Vale e BHP Billinton terão que se  responsabilizar  pelo custeio das indenizações e pelo ressarcimento ao estado de “todo e qualquer custo decorrente da requisição administrativa”, conforme termo de ajustamento de c onduta (TAC) celebrado em 20 de setembro de 2016. O decreto já está valendo desde ontem.

O TAC citado no decreto foi assinado pela Samarco, as suas controladoras – Vale e a BHP Billiton Brasil –, o Estado de Minas Gerais, o Instituto Estadual de Florestas, o Instituto Mineiro de Gestão das Águas e a Fundação Estadual do Meio Ambiente, com a chancela da Advocacia-Geral do Estado.

A Samarco afirmou que a decisão de fazer a obra em Bento Rodrigues foi tomada “após uma ampla e profunda discussão e análises técnicas”. “Outros locais foram descartados sobretudo pelo caráter emergencial da obra e pela proximidade do período chuvoso. A construção em outra área exigiria um prazo maior de construção”, informou a empresa por meio de nota.

Segundo a Samarco, o S4 integra o sistema emergencial de retenção de sedimentos composto pelos diques S1, S2 e S3, além das barragens Eixo 1 de Fundão e Nova Santarém. Ele será feito por um alteamento com pedras  construído em recuo já existente, um pouco abaixo de Bento Rodrigues, e ampliará a chamada área de clareação dos rejeitos. Isso evitará, na avaliação da mineradora, que a poluição volte a atingir o Rio Gualaxo e, consequentemente, o Rio Doce.

O dique S4 será o segundo maior do complexo e terá capacidade de 1,05 milhão de metros cúbicos. Fica atrás apenas do S3, que tem capacidade de 2,1 milhões de metros cúbicos. O S1 e o S2 têm 15 mil e 45 mil metros cúbicos, respectivamente.

Com a construção do dique S4, parte da área impactada de Bento Rodrigues será alagada. A empresa garante que vai fazer obras que evitem danos no muro colonial que ainda existe no local e que foi até motivo para os moradores criarem um abaixo-assinado contra as obras no distrito. “O muro de pedras existente no distrito também será preservado por uma cobertura. A ruína da Capela São Bento e o Cemitério não serão alagados”, afirmou a Samarco.
Procuradores do Ministério Público Federal (MPF) informaram, por meio da assessoria de imprensa, que ainda estudam a construção do Dique S4 em Bento Rodrigues e que não vão comentar a decisão enquanto os trabalhos não forem concluídos.

O Ministério Público de Minas Gerais afirmou ter dúvidas sobre a eficácia do dique. “O MP não é contrário a nenhuma medida que traga segurança para a sociedade. Porém, esse sistema da Samarco é de incertezas”, disse o promotor Carlos Eduardo Ferreira Pinto, coordenador do Núcleo de Resolução de Conflitos Ambientais (NUCAM). Segundo ele, o MPMG vai analisar “com muito cuidado e serenidade a autorização para verificar se alguma medida será tomada”.

(Estado de Minas, 22/09/2016)